
"O MUNDO A PARTIR DA ÁFRICA E TAMBOR QUE FAZ A GIRA GIRAR" será o enredo que a Sociedade Recreativa Beneficente e Esportiva do Lavapés levará para seu carnaval em 2020.
A escola de samba mais antiga em atividade em São Paulo reverenciará o Tambor como elemento agregador dos povos africanos trazidos para o Brasil e apresentará sua permanência como símbolo de união e resistência nas gerações afrodescendentes.
O tocar do tambor ou o ato de bater em algo que emita som é considerado como uma língua agregadora dos povos originários da África. Apesar de, ainda hoje, as pessoas entenderem a África com um lugar homogêneo, este continente milenar é formado por diversos povos, com dialetos diferenciados entre si e detentor de uma cultura singular caracterizada pela junção de diversos costumes, comportamentos e tradições.
As características são percebidas como únicas a cada região africana desde os dialetos próprios até os tipos de roupas, penteados e adornos - passando também por uma variedade de rituais em datas importantes como nascimento, morte e casamento.
O processo da escravidão causou aos africanos a perda da identidade de sua nação, o dilaceramento de suas famílias, de seus bens e cultura, ou seja, aquelas características marcantes de identidade de um grupo deixaram de existir. Porém, um conjunto especial de características não pode ser calado no infortúnio da escravidão: o som das batidas que ecoavam na madeira dos navios negreiros resistiu como um elemento de identificação e fonte de congregação entre todos os africanos que estavam no mesmo barco nas travessias transatlânticas.
A interação entre os capturados em África nos porões dos navios se mostrava – em muitas ocasiões - pouco eficaz através da fala, em função da presença de dialetos distintos. Desta forma, os sons e as batidas foram elementos fundamentais de agregação, comunicação e comunhão entre as pessoas diante ao cenário de atrocidades deste período.
TAMBOR veio para o Brasil com suas inúmeras variações de toque, sendo a atual cidade de Salvador - na Bahia - um dos primeiros portos de chegada. Salvador é a maior guardiã da ancestralidade africana no Brasil e, por consequência, dona de diversos espaços que cultuam as religiões, as deidades e os costumes oriundos do continente africano que tem o TAMBOR como forte representação da herança ancestral.
A religiosidade afrodescendente entende o Tambor como um símbolo primordial, o elo perfeito que estabelece a ligação entre o céu e a terra na realização de seus cultos e tradições. Assim, ao apresentar este enredo a Lavapés trará os ritmos, os louvores, as danças e festas que cultuam este objeto sagrado, dando destaque à capoeira, ao reisado e ao maculelê, entre outras festividades.
O Tambor também é reverenciado como um instrumento agregador do povo brasileiro. Mesmo com boa parte das origens apagadas nestes séculos de história, o nosso povo ainda se reúne ao redor do TAMBOR na intenção de promover união, paz, felicidade, alegria e congregação entre irmãos, como demonstram as celebrações nos grupos de dança e de folclore, nas rodas de samba, nos eventos festivos do carnaval e na própria natureza das escolas de samba.
Por fim, renderemos saudações à Madrinha Eunice, grande sacerdotisa dos cultos afrobrasileiros, ícone máximo do samba paulistano e fundadora da Sociedade Recreativa Beneficente Esportiva do Lavapés.
A escola de samba com mais de 80 anos de existência e que teve início pelas mãos desta filha de escravos - pede agora em 2020 - a licença, a força e o olhar ancestral de sua Mãe e Criadora para iniciar um novo ciclo de sua magnífica trajetória no carnaval paulistano. Madrinha Eunice, olhai para o seu povo, vai começar tudo de novo.
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