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		“Um barulho surdo e contínuo faz tremer a terra, um 
		barulho faz mil barulhos, corta a todo instante um golpe formidável. 
		[...] É o reino do Ferro onde reina sua Majestade o Fogo! O Fogo está 
		por toda parte, aqui um braseiro, ali uma labareda, acolá blocos de 
		Ferro ardente. [...] As máquinas vorazes engolem esse Fogo, esse Ferro 
		resplandecente, o trituram, o serram, o achatam, o afiam, o torcem, dele 
		fazem locomotivas, navios, canhões, mil coisas diversas, delicadas como 
		esculturas de artistas, monstruosas como obras de gigantes.” 
		 
		Guy de Maupassant“Au 
		Soleil”
 O Ferro é o 
		elemento químico 26 e peso atômico 55,847. Funde-se a 1.536 ° C e entra 
		em ebulição a 3.000 ° C. Na natureza, apresenta-se principalmente 
		combinado com o oxigênio em forma de óxidos: hematita (Fé O), limonita (Fe 
		O nH O) ou siderita (Fé CO). Constitui 5% da crosta terrestre e 35% de 
		seu núcleo, sendo o segundo elemento mais abundante dentre os metais. O 
		minério tem cor branco-acinzentado, e fundido, transforma-se em metal de 
		cor cinzento-azulado. Em contato com o oxigênio presente na água e no 
		ar, se oxida e desta reação surge a ferrugem. 
		METAL CELESTE A 
		astrofísica mostra o ferro presente no sol e nas estrelas. É o acúmulo 
		do metal no núcleo de uma estrela que desencadeia a explosão de uma 
		supernova, e a dispersão dos átomos essenciais à vida pelo cosmos.
		 
		Na antiguidade, por causa de sua presença nos meteoritos caídos na 
		terra, o ferro era considerado uma dádiva de Deus. Isso é comprovado por 
		inúmeros textos antigos, como nas plaquetas de argila de origem suméria, 
		onde aparece a palavra mais antiga para denominá-lo: 
		an bar 
		, constituída pelos signos pictográficos «céu» e 
		«fogo» , traduzida por “metal celeste” ou “metal estrela.” 
		 No 
		livro sagrado dos muçulmanos, Alah diz: “E Nós fizemos descer o ferro, 
		no qual existe uma força formidável, mas também muitas utilidades para 
		as pessoas”. Ele é realmente o mais útil dos metais, essencial à vida em 
		todos os níveis, e constituinte vital nas células. No organismo humano, 
		ele é necessário para a produção de hemoglobina, que transporta o 
		oxigênio do pulmão para todas as células do organismo, garantindo a 
		"respiração" de cada uma delas.  Quando 
		Cortez, o conquistador espanhol, perguntou aos chefes astecas de onde 
		obtinham o ferro de suas armas, eles lhe apontaram o céu.  Sua 
		origem celeste explica porque os gregos chamaram o ferro de sideros 
		(celeste), e ao trabalho com o ferro, de siderurgia. Em sua mitologia, 
		Hefesto (vulcano para os romanos) era o deus ferreiro, que desceu do 
		Olimpo e montou sua forja de vinte foles no vulcão Etna.  
		Acredita-se que o homem tenha descoberto o ferro no Período Neolítico, 
		quando perceberam que as lavas dos vulcões, ao esfriarem, se 
		transformavam em metal bruto. Ou quando esses primitivos habitantes das 
		cavernas viram as “pedras” usadas para circundar fogueiras, serem 
		reduzidas a metal sólido.  
		FERRO SAGRADO Os 
		primeiros sinais de uso do ferro aparecem no Antigo Egito, por volta de 
		4000 aC , na forma de objetos cerimoniais. Por seu caráter “sagrado” era 
		considerado um metal temido pelos demônios, motivo pelo qual usavam-se, 
		como amuletos, muitos anéis e colares de ferro.  Para os 
		chineses, o ferro era portador de uma força sagrada capaz de afastar os 
		temíveis dragões aquáticos, motivo pelo qual se enterravam figuras 
		feitas do metal nas margens dos rios e lagos.  Antigos 
		escritos falam do Rei de Angkor (atual Camboja), considerado 
		invulnerável porque usava, inserido em seu corpo, um pedaço de “ferro 
		sagrado”.  Desde a 
		Grécia antiga a ferradura era considerada um amuleto poderoso. Os 
		romanos passaram essa crença aos cristãos, que creditaram a superstição 
		a São Dunstan de Canterbury (924-988), arcebispo e ferreiro inglês. 
		Segundo a lenda, Dunstan teria colocado ferraduras no próprio demônio, e 
		somente as retirou depois de ouvir dele a promessa de que nunca mais se 
		aproximaria do objeto.  A 
		famosa Coroa de Ferro, guardada na Catedral de Monza, na Itália, é ao 
		mesmo tempo uma relíquia sagrada e uma insígnia real. Seu nome vem do 
		círculo de ferro que ela contem, que teria sido forjado à partir de um 
		dos cravos usados na crucificação de Jesus, recuperado por Santa Helena 
		de Constantinopla. 
		 
		A IDADE DO FERRO Ao 
		descobrir as técnicas de fundição do ferro e suas ligas, o homem iniciou 
		o advento da história e do progresso vertiginoso que caracterizou a 
		humanidade nos últimos 5.000 anos. O domínio da siderurgia possibilitou 
		aos povos que a dominaram, a oportunidade de também dominarem os povos 
		circunvizinhos.  A 
		exploração do ferro e sua produção começou a ser feita pelos hititas, 
		que extraíam o minério de depósitos naturais, ao longo do Mar Negro. Em 
		1500 a .C , somente eles conheciam a fonte do minério e a técnica de 
		fundi-lo, e detiveram esse segredo por três séculos. O rei usava um 
		cetro de ferro, por considerá-lo mais valioso que o ouro.  A 
		arqueologia data o ano 1.200 a .C., como o início da Idade do Ferro, por 
		causa da presença dos filisteus na civilização Cananéia. A superioridade 
		de suas armas explica a derrota que por certo tempo sofreu Israel ante 
		os filisteus.  A 
		Bíblia faz referência à superioridade bélica do Rei de Canaã: ”Os filhos 
		de Israel clamaram ao Senhor, porque Jabin tinha 900 carros de ferro e 
		oprimia-os duramente já fazia 20 anos (Jz 4,3) .”  À 
		partir do primeiro milênio a.C., o ferro promoveu grandes mudanças na 
		sociedade. As armas de ferro, mais resistentes que as de bronze, 
		possibilitaram aos povos que dominavam as técnicas de produção, a 
		oportunidade de dominarem os povos circunvizinhos, formando vastos 
		impérios. Esses movimentos bélicos em massa alteraram a paisagem humana 
		da África, da Ásia e da Europa.  Nos 
		áureos tempos do grande Império Romano, o minério vinha de Hispânia, uma 
		de suas províncias, produtora das famosas “lâminas de Toledo”. 
		 Com o 
		declínio do Império Romano , a produção de ferro desenvolveu-se bastante 
		na Espanha, com a criação das “ 
		forjas catalãs”. Com a 
		temperatura no interior dos fornos chegando pela primeira vez aos 1200º 
		C, passou-se a produzir um líquido incandescente, o ferro fundido. As 
		forjas catalãs foram inseridas no resto da Europa, e a agricultura se 
		desenvolveu com rapidez, por causa dos implementos agrícolas. O ferro 
		fundido introduziu facilidades também na vida quotidiana, principalmente 
		nos utensílios de uso doméstico.  A 
		REVOLUÇÃO INDUSTRIAL
 
		Marcando a chegada da era moderna, inicia-se na Inglaterra, no século 
		XVIII, a Revolução Industrial, que caracterizou-se pelo desenvolvimento 
		das técnicas de produção. No lugar das pequenas oficinas surgiram 
		grandes fábricas de chaminés altas, que espalhavam a fumaça do 
		progresso. O crescimento da produção de minério de ferro e carvão 
		necessitou de um sistema de transporte mais eficaz do que o existente, e 
		a estrada de ferro chegou para revolucionar esse setor. O ferro 
		transformou as lentas e frágeis embarcações em velozes navios a vapor.
		 Na 
		arquitetura ele substituiu a pedra, permitindo a construção de edifícios 
		mais leves , dinâmicos e modernos. Londres ganhou o seu famoso Crystal 
		Palace, e o engenheiro substituiu o arquiteto nos grandes projetos. A 
		França ganhou a Torre Eiffel, que do alto de 320 metros , triunfa como 
		seu grandioso símbolo. Seu autor, o engenheiro Gustave Eiffel, criou a 
		estrutura de aço para o escultor Frédéric Auguste Bartholdi , no projeto 
		do maior símbolo da América, a Estátua da Liberdade.  
		Aprimorando as técnicas de transformação do ferro em aço, e mudando os 
		conceitos estéticos, a Revolução Industrial consagrou o ferro como o 
		metal da era moderna.  
		O BRASIL E A SIDERURGIA Em 
		carta dirigida a Dom João III em 1522, o bispo Dom Pêro Fernandes 
		Sardinha faz o primeiro registro oficial sobre a existência de ferro no 
		Brasil. Pouco depois o padre José de Anchieta relata e seus superiores a 
		abundância do minério nas jazidas de Ubatá, em Santo Amaro. Para ajudar 
		na catequização dos índios, fabricaram anzóis, cunhas, facas e outros 
		objetos de ferro.  Tendo 
		D. Maria I proibido a existência de fábricas de ferro no Brasil, o 
		movimento dos inconfidentes mineiros registra em seu ideário a 
		necessidade da implantação de uma siderurgia brasileira como base para a 
		independência econômica do país.  Com a 
		transferência da corte portuguesa para o Brasil, D. João VI fez 
		estabelecer a Real Fábrica de Ferro em São João do Ipanema (atual 
		Sorocaba).  O 
		Barão de Mauá, em uma viagem à Inglaterra em 1840, ficou tão maravilhado 
		com o progresso que viu ao visitar uma fundição na cidade de Bristol, 
		que afirmou: “ 
		a indústria que manipula o ferro é a 
		mãe de todas as outras ”. Cinco anos 
		depois de conhecer as maravilhas da Revolução Industrial, adquire uma 
		pequena fundição em Niterói, de onde saíram 72 navios e embarcações para 
		o tráfego no rio Amazonas, várias pontes de ferro, tubos para canalizar 
		rios e os encanamentos destinados a distribuir gás, além dos lampiões de 
		ferro para a iluminação da cidade do Rio de Janeiro. Os cariocas ainda 
		deslumbrados com a iluminação da cidade, assistiram à inauguração dos 
		primeiros 15 quilômetros de ferrovias no país, percorridos pela 
		locomotiva “Baronesa”. Mas o sonho do Barão de Mauá em transformar o 
		Brasil em uma potência industrial foi interrompido por rumorosa 
		falência.  A 
		siderurgia continuou a funcionar timidamente até o início do século XX, 
		apesar da quantidade enorme de minério de ferro contido em nosso 
		subsolo.  
		Convencido de que a fraqueza do país decorria da falta de eficiência no 
		setor siderúrgico, em 1938 Getúlio Vargas criou a Comissão Executiva do 
		Plano Siderúrgico, com o objetivo de construir no país uma grande usina, 
		inaugurada em 1946. Outras grandes surgiram para fortalecer a siderurgia 
		nacional.    Com a 
		abundância de minério no Quadrilátero Ferrífero, e o “tesouro” 
		descoberto na Serra de Carajás, o Brasil passa a ter a maior capacidade 
		de produção no mundo. O setor siderúrgico cresce, se moderniza, 
		tornando-se grande, poderoso, um gigante de ferro e aço.  
		E a Vila Maria, 
		gigante no carnaval, com a força de sua bateria, coração de aço do 
		samba, e a voz de cada um de seus componentes, a ferro e fogo canta o 
		vitorioso metal, em busca de sua vitória pessoal.   |